27 May 2010

Matthieu Ricard no meu longo post :o)

[aviso aos dois ou três que ainda por aqui passam, o post é longo! Sobre a Felicidade, mas Loooongo :o)]

O convite foi estranho, apesar de, confesso, esperar mais um convite estranho num qualquer dia de tempo inconstante [hehehe o que nestes dias não é nada raro - mas como eu tenho a pretensão de que o meu estado de espírito é o que controla este clima... o verão vai ser ameno e não com fervor como no ano passado (do qual mal me lembro a partir de Abril até Outubro... mas que sei ter sido quente quase desde Fevereiro) - a mim tanto me dá. Gosto de chuva e de sol, come what may, aceito o que vier sem grandes dramas.]

Ora, falava eu do convite que me fez rir, a princípio... uma palestra na Aula Magna... Não se entenda mal, gosto muito da Aula Magna e tive por lá tempos muito felizes... tanto quando cantava com os Onda Choc (hehahahaha) naquele palco em festas de Natal (mas isso dava para outro post, noutros Carnavais!), como enquanto estudante da Faculdade de Letras, assistia a colóquios, palestras e até a um festival de Tunas. Ah! E que boa recordação, ver Lamb sentadinha no palco...! E Muse nas cadeiras Doutorais na linha da frente onde rebentaram os balões gigantes com confettis brilhantes lá dentro! Foi um espectáculo bonito para os olhos.

Ora... "Neurociência e Felicidade" - Por um monge budista considerado através de meticulosos testes neurológicos, o homem mais feliz do mundo. Investiguei e acabei por achar, que dadas as circunstâncias da minha vida presente, seria positivo ir, fosse como fosse. E lá fui.

O monge era amoroso, a sua língua materna é o Francês mas acabou por falar em Inglês com uma irritante tradução simultânea por outro tipo em Português o que quebrou um pouco o ritmo da coisa - mas tudo bem, a presença do Sr. Monge era apaziguadora e tranquilizante o suficiente :o).

E falou bastante durante aquelas duas horas, e tinha um humor extraordinário (que, na tradução do senhor monocórdico, se perdia completamente - daí eu sempre dizer ao longo da faculdade que as traduções assassinam um pouco o que é originalmente escrito noutra língua... mas há que haver tradução... senão como teria eu lido o "Diário de Anne Frank" originalmente escrito em Holandês??)
Falou sobre como todos somos subjugados por sentimentos de sofrimento, tristeza, não por identificação moral do que sabemos ser errado, mas sim porque se sentem e nos fazem experienciar o sofrimento. Matthieu explicou como a meditação poderá ajudar a atenuar estes sentimentos, saber como os refrear, como a meditação ajuda a entrar em estados mentais positivos, de florescimento interior e profundos sentimentos de auto-confiança.

Se dedicarmos algum tempo a pensar na questão, todos os sentimentos "maus" têm uma boa função a si associada:
A Ira ajuda-nos a afastar os inimigos e a protegermo-nos;
O desejo por algo que não se tem, ajuda-nos a procurar obter o que queremos e ajuda-nos a reproduzir (como humanos);
O ciúme ajuda-nos a querer sentir mais coesão com o outro, e por aí fora.

No entanto, se estamos muito tempo constrangidos por sentimentos maus, como ciúme, ansiedade, o domínio pelo medo, obsessão com a antecipação e repensar do futuro, bem como o repensar do passado, seremos dominados pelas "toxinas da infelicidade".
Assim sendo... passamos fazer parte intrínseca do problema.
A solução será filtrar o que nos faz sentir mal, fazendo com que esse estado não fique parte de nós.
Como por exemplo as vestes vermelhas do monge, se manchadas por uma grande nódoa, poderiam ficar estragadas e ser necessário pô-las de parte ou destruí-las. Mas se optarmos pelo lado positivo, poderiamos apenas esfregar a nódoa, que continuaria a fazer parte das vestes, mas não seria parte intrínseca e destruição das mesmas.
Ou da mesma forma como (e aqui pegou num copo de água) podemos adicionar um remédio à água e torná-la uma componente curativa, ou adicionar cianeto e esta passar a ser mortal... Há sempre uma hipótese mais positiva que nos torna o problema menos "intrínseco" e parte de nós, de filtrar e destilar a água. "Água é sempre água"

O importante nisto tudo, é a consciência, a qual no humano é comum a todos os pensamentos: estamos geralmente conscientes de tudo o que vivemos, sentimos - se estamos tristes, sabemos que estamos em estados de tristeza - e é aí que entra a "qualidade luminosa" (ou da qualidade da luz... em termos budistas)

Sem a luz nada vemos, a luz ajuda a percepcionar mas não se altera a sí própria. A luz revela e não se modifica.
Se fazemos incidir luz num monte de lixo, a luz nao se transforma em lixeira, permanece simplesmente a mesma, apenas revelante. Se a luz iluminar ouro, não se torna a ela mesma em riqueza.

Assim sendo, segundo Matthieu, esta é uma faculdade da mente.
A mesma coisa se passa com um espelho. Um espelho pode reflectir infinitas vezes imagens e não se altera a si mesmo, não se gasta apenas por reflectir.
Conclusão, a mente pode ter qualidades luminosas como as da luz e não tem que se gastar se assim escolhermos.

Quando algo na vida nos traz conteúdos, moldados ao longo da vida, alterados, são esses que condicionam os nossos estados de espírito e que formam a nossa personalidade, aquilo que somos.
Para alterar isso, caso o queiramos, é necessário "inverter o processo". Obviamente uma inversão destas não acontece por magia, como tudo, apenas com treino.
Tendo por exemplo uma folha ou um papiro que esteve enrolado durante muito tempo, quando desenrolado, muito rapidamente voltará a enrolar-se e a tomar a forma a que está habutuado... mas se, pacientemente passarmos várias vezes as mãos por ele, conseguiremos endireitá-lo.
Por isso mesmo devemos estar atentos aos momentos mentais. Se as coisas são demasiado fáceis, rápidas e baratas, poderá ser um sinal de que nada estará a acontecer.
Ninguém adquire o conhecimento de nada sem tempo, qualquer ofício precisa de tempo. Coisas simples como aprender a tocar piano levam algum tempo e acima de tudo, exigem treino e método.

Treinar a mente para expulsar as coisas más não é algo que aconteça de um dia para o outro. É preciso treinar e muito. Diz-se no Budismo que há 84 mil métodos de meditação (hehehe!). Há tantos métodos como há estados de mente nos seres sencientes...

Há assim, muitas formas de treinar a mente. Uma delas é meditando sobre os opostos.
Sabemos que o fogo é o oposto da água, que o frio é o oposto do calor, que o amor é o oposto do ódio. Há incompatibilidades reconhecíveis. Assim sendo podemos e temos a capacidade de focar nas características benevolentes, cultivar os estados positivos dos "opostos".

Num mesmo instante não é possível sentir opostos, (aqui discordei um pouco... quantas vezes já ri e chorei ao mesmo tempo...mas o monge disse que:) quando estendemos a mão para praticar um acto bom, não estaremos a praticar um acto mau. (aqui pensei que o tipo deve ter passado tempo demais em "eremitação" e não conhece este mundo como ele o é realmente... mas não temos que concordar com tudo!)

Meditar não é mais do que cultivar, familiarizar a mente aos antídotos da benevolência. Não deixar entrar ou optar por expelir as toxinas negativas da mente.

O amor incondicional que podemos sentir por alguém ou por momentos, pode ser preservado. Esse é um método de meditação: a neuroplasticidade mental. Manter em mente um sentimento de felicidade e mesmo que este estado passe, preservá-lo por mais tempo na nossa mente.

Um outro método é não nos deixarmos identificar com o que sentimos de negativo...
Quando tudo o que nos preenche são pensamentos negativos e sentimos que não há espaço para mais nada, teremos, como fora dito antes, consciência dessa mesma ansiedade, assim sendo, há um momento em que podemos, ao invés de focar na ansiedade, focar na consciência que temos desse estado. Acabando por haver em nós espaço para dois elementos, a ansiedade mas também a consciência dessa mesma ansiedade.
Se escolhermos focar na consciência a emoção altera-se lentamente. Tal como o sol lentamente derrete o orvalho todas as manhãs.
Desenraízar a e controlar a tendência que a emoção má tem para emergir.

A Felicidade é algo de muito frágil. Vai e vem. E mesmo nós como humanos nos cansamos da Felicidade.
Se gostamos muito de uma música podemos ouvi-la, 4, 5, 6...10 vezes, mas não nos iríamos sentir felizes se estivessemos 48 horas a ouvir sempre a mesma coisa.
O podemos adorar comer chocolate e a sensação de comer uma barra pode saciar-nos, mas nunca iriamos comer 50!

Para cultivar qualidades mentais é preciso ser-se e estar-se qualificado (passo a expressão!) caso contrário estaremos sempre vulneráveis a sentimentos e estados de mente menos positivos.

A Felicidade poderá ser vista como um modo de ser, através da qualidade da mente. Se escolhermos juntar o "amor altruísta" e a liberdade interior, se através da mente conseguirmos fazê-las crescer juntas, ajudaremos a impregnar todos os nossos estados mentais com qualidades e não com vulnerabilidades.

De resto será sempre necessário ter cuidado por existe uma forma de Felicidade que é muito egocêntrica, pouco altruísta, apenas a pensar no "Eu". Este tipo de Felicidade poderá trazer algo de bom a apenas uma pessoa e causar desconforto nos outros. Neste tipo de felicidade centrada no egoísmo, dá-se como que a criação de uma bolha de ego e de negativismo, de disfunção, obsessão, que geralmente acaba mal, conduz ao falhanço e a uma espécie de destruição.
Ao passo que a Felicidade baseada no amor altruísta (que é considerado pelo Budismo, o mais positivo de todos os estados de mente), então o que estaremos a cultivar será amor a par com a paz que nos traz estar bem com os outros. Estaremos assim a par com a nossa Felicidade, cultivando-a mais e mais.

Passámos à Neurociência e o Monge passou uma série de slides que nos mostrou através de meticulosos testes em pessoas que não meditam versus pessoas que meditam, como uns e outros apresentam dados e valores impressionantes nas suas diferenças, quer a nível de stress, de conduções de saúde, pressão arterial, capacidades auto-curativas ou menores propensões a doenças cardio vasculares ou outras doenças consideradas incuráveis.

Deu-se espaço para as perguntas e um jovem mais atrevido propôs que Matthieu aproveitasse a energia de tanta gente para tornar a meditação mais poderosa, fazendo um pequeno exercício de "iniciação à meditação".
Matthieu riu muito, mas assentiu.

Pediu-nos que nos sentássemos numa posição equilibrada e confortável e para começarmos a tentar focar a nossa atenção num objecto imaginário, escolheu um pedaço de pão. Deviámos imagina o pão a aproximar-se do nosso nariz e a afastar-se, aprocimar-se a e afastar. Devíamos focar nisso. Se a nossa mente se afastasse, o que seria natural, voltarmos a tentar focar.
Fizemos este exercicío durante minuto e meio, sensivelmente. Algumas pessoas riam, mas acabaram por entrar no "jogo".
O exercício seguinte era nada mais do que fazer perdurar na mente um sentimento bom. Daqueles que acontecem e passam... mas ao invés de o deixar apenas passar, mantê-lo "congelado", ou em repetição, perdurando na mente.
O exemplo que deu foi pensarmos numa criança, alguém puro. Uma criança a quem desejássemos apenas e só o bem, o carinho, a vontade de abraçar e amar, um sorriso dessa criança... e fazer perdurar esse sorriso durante o resto do tempo do exercicío.

A sessão acabou.

Agradeci ao gentleman que me convidou e fiquei muito sorridente pois percebi que nesse dia, não sabendo que iria acabar a noite naquela palestra, o facto de ter insistido em dar boleia à Mana Carla e ao pequeno Tiago até à escolinha, não fora por mero acaso.
Aquele sorriso e a pequena mãozinha a dizerem-me adeus quando passou pela janela do carro e enquanto caminhava para a escola, fizeram-me ganhar o dia.
Foi o exercicío mais fácil!
Pelo teu sorriso e por seres tão fofinho, obrigada Tiaguinho. :o)

3 comments:

Gelo said...

por momentos ainda pensei que a repetição no fim era para preservar um pensamento positivo :)

(n)Ana said...

Não... o meu pc é que tá maluco... não era nada disto.

(n)Ana said...

Não... o meu pc é que tá maluco... não era nada disto.